Percepção e realidade

Percepção e realidade

Por José António Baço (colunista de A Notícia - hoje
“É como se não tivesse existido a ação. O deputado é ficha-limpa”. A frase é do advogado Carlos Adauto Virmond Vieira, que atuou na defesa de Marco Tebaldi no processo em que o deputado federal foi condenado, pelo Supremo Tribunal Federal, a três anos e dois meses de prisão (em regime aberto). Não é despiciendo lembrar que o processo, motivado pela prática de desvio de dinheiro público, segundo texto do “AN”, prescreveu e a pena não vai ser cumprida.
Não se trata de discutir questões legais (a Justiça decidiu), mas há um fato que chama a atenção: a ênfase na condição de ficha limpa do deputado. A psicologia social ensina que o comportamento dos indivíduos em geral – e dos eleitores em particular – é definido pela relação entre percepção e realidade. Será que a expressão ficha limpa é aplicável ao caso? A realidade dos fatos diz que sim. Mas a percepção do eleitor abre outras portas.
Se uma pessoa é considerada culpada e acaba beneficiada por uma brecha legal, haverá razão para passar uma borracha sobre os fatos? Não. O episódio levanta questões. A primeira, que parece ser a mais séria, aponta para a ineficácia da Justiça. Todos sabemos que a democracia é erigida sobre os poderes, e quando um deles falha, neste caso deixando prescrever processos, é a própria democracia que fica em risco.
Outro ponto importante, em termos de percepção, é a legitimação da ideia de que as pessoas com algum poder – econômico ou político – ficam impunes e que apenas os mais desprotegidos estão sujeitos aos rigores da lei. Aliás, a história ensina que essa percepção não é fruto do acaso. A sensação generalizada de que existem cidadãos de primeira e cidadãos de segunda classe é corrosiva para a democracia.
Também é inquietante ver o silêncio de algumas pessoas que passam os dias a bradar contra a corrupção. Sequer uma palavra. Será que estamos frente a um caso de indignação seletiva? O mais preocupante, no entanto, é saber que daqui a quatro anos tudo isso estará esquecido. Os políticos contam com a amnésia dos eleitores. E assim caminha a incipiente e insipiente democracia brasileira…
É a vista do meu ponto.

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